sexta-feira, 28 de junho de 2013

Terapia Cognitivo-comportamental - TCC

No texto anterior, abordei o olhar sobre o corpo e sobre a alimentação. Neste texto, o objetivo é informar como surgiu a terapia cognitivo-comportamental e como esta pode auxiliar não só no que se refere ao emagrecimento, como também em variadas questões.
O olhar sobre a cognição nasceu a partir do questionamento existente a respeito de como a psicanálise e a abordagem comportamental lidavam com o problema da depressão. Na década de 60, tais questionamentos fizeram que alguns profissionais dessas abordagens buscassem nos processos cognitivos a explicação para os transtornos psicológicos. Nessa mesma década, Aaron Beck, ainda psicanalista, conduziu experimentos e observações clínicas, na qual se pensava na depressão como sendo uma raiva voltada para dentro. De acordo com Beck, os sonhos estavam associados à depressão, porém percebeu que os mesmos conteúdos presentes nos sonhos, estavam também presentes nos pensamentos dos pacientes. Tal conteúdo era sempre ligado à autocrítica, pessimismo e negatividade. Esta descoberta foi de grande importância para o surgimento da Terapia Cognitiva (PADESKY, 2010).
A partir daí, Beck passou a associar a depressão a padrões negativos de pensamento, levando ele a criar o Beck Depression Inventory (Inventário de Depressão de Beck – BDI), sendo este aperfeiçoado ao longo do tempo, passando a apontar também mudanças na motivação e no funcionamento físico. Além disso, é considerada a escala mais usada para mensurar a depressão (PADESKY, 2010).
Com isso, a Terapia Cognitiva (TC) foi cada vez mais se desenvolvendo e conquistando espaço no meio acadêmico. Segundo Knapp (2004), a Terapia Cognitivo Comportamental envolve mais de vinte abordagens terapêuticas, mas independente das diferenças que possam ocorrer, existem características comuns entre elas:
-  Estão ligadas ao fato de considerar o comportamento como sendo influenciado pela cognição;
-  Que a cognição pode ser monitorada e modificada;
-  Que o comportamento desejado pode ser conseguido a partir da mudança de pensamento.
A TCC de Beck, inicialmente foi desenvolvida para o tratamento da depressão e atualmente pode ser aplicada em uma série de outros transtornos e/ou áreas. O foco do trabalho terapêutico está em identificar e reparar padrões de pensamentos disfuncionais por meio do levantamento de hipóteses que serão confirmadas ou não ao longo do processo. Segundo TEIXEIRA (2004, p.302) “As origens dessas distorções vêm de erros decorrentes da organização cognitiva individual que as pessoas desenvolvem ao longo do curso da vida.” Dessa forma, a terapia cognitiva está pautada na relação entre pensamento, emoção e comportamento, levando em consideração que não é a situação ocorrida que ativa os sentimentos, mas sim o que pensamos acerca da situação. Quando tais pensamentos são disfuncionais, suscitam sentimentos considerados negativos, podendo ocorrer dificuldade na adaptação do individuo em seu meio. 
Burns (1989 apud Knapp, 2004, p.20) “Nós sentimos o que pensamos” e por mais simples que pareça, não é bem assim. Freeman et al (1990 apud Knapp (2004, p.20) ressalta o seguinte:
“Mas a TC não é um modelo linear em que “as situações ativam pensamentos, que geram uma consequência com resposta emocional, comportamental e física”. Há uma interação recíproca de pensamentos, sentimentos, comportamentos, fisiologia e ambiente. É reconhecido que as emoções podem influenciar os processos cognitivos e que os comportamentos também podem influenciar a avaliação de uma situação pela modificação da própria situação ou por evocar respostas de outras pessoas”.

Na terapia cognitiva, quando se fala em cognição, é necessário apontar que identificamos e trabalhamos com três níveis de cognição. São eles:
-  Pensamentos automáticos;
-  Pressupostos subjacentes ou crenças intermediárias;
-  Crenças nucleares ou centrais.
De acordo com a figura abaixo proposta por Knapp (2004), é possível perceber como são organizados os níveis de cognição. Os pensamentos automáticos estão ligados às crenças intermediárias que por sua vez estão ligadas as crenças nucleares ou centrais.



Os pensamentos automáticos como o próprio nome já diz, são os pensamentos que vem automaticamente à mente, de maneira rápida e que muitas vezes não são percebidos por quem os tem. Quando tais pensamentos são disfuncionais, eles atuam em cima das emoções e do comportamento do indivíduo, podendo vir em forma de pensamentos ou também em forma de imagens. Os pensamentos automáticos podem ocorrer através de situações internas, como por exemplo, um enjoo, ou externas, como por exemplo, alguém não retribuir uma saudação. Segundo Beck, “você pode aprender, no entanto, a identificar seus pensamentos automáticos prestando atenção às suas mudanças de afeto” (1997, p.30).
Os pensamentos automáticos podem ser de três tipos: Beck (1995 apud Knapp (2004, p.25) 
1.      Distorcidos, ocorrendo apesar das evidencias em contrário. 
Ex.: “Se me separar, nunca mais serei feliz”. 
2.      Acurados, mas com a conclusão distorcida. 
Ex.: “Meu filho não me telefonou até agora, deve estar incomodado comigo”. 
3.      Acurados, mas totalmente disfuncionais. 
Ex.: “Com essa lesão articular, a vida perdeu a graça, pois nunca mais poderei jogar tênis”.

Os pressupostos subjacentes ou crenças intermediárias como também são conhecidos influenciam os pensamentos automáticos e são influenciados pelas crenças centrais. Referem-se a padrões, atitudes, normas e regras impostas pelo individuo em situações vividas no dia a dia e estão sempre associadas a uma condição, que sendo seguida á risca, transcorre tudo maravilhosamente bem. O não cumprimento dessas crenças intermediárias pode ocasionar na ativação das crenças centrais negativas (KNAPP, 2004).
Segundo Beck (1997, p.32), “Em uma situação específica, as crenças subjacentes da pessoa influenciam sua percepção, que é expressa por pensamentos automáticos específicos à situação. Esses pensamentos, por sua vez, influenciam as emoções da pessoa”.
Exemplificando, vamos supor que uma pessoa tenha uma crença central de fracasso (falaremos sobre crenças centrais mais a frente) e tenha uma crença intermediária do tipo “tenho que ser o melhor em tudo que faço”. Percebem que existe uma condição? Caso ele não seja o melhor, sua crença central poderá ser ativada, ou seja, ele se achará um fracassado.
As crenças nucleares ou crenças centrais são formas de cognição mais internalizadas, consideradas verdades absolutas, percebidas de maneira rígida e generalizada pelo individuo, pois estão relacionadas às construções adquiridas na infância sobre a própria pessoa, o outro e sobre o mundo. Tais construções são fortalecidas ao longo dos anos, no qual servem de modelo para a interpretação de eventos ocorridos, formando o jeito psicológico de ser de cada um.
Beck (1995 apud Knapp, 2004, p.23) apresenta três agrupamentos de crenças disfuncionais:
1.      Crenças nucleares de desamparo (crenças sobre ser impotente, frágil, vulnerável, carente, desamparado, necessitado).
2.      Crenças nucleares de desamor (crenças sobre ser indesejável, incapaz de ser gostado, incapaz de ser amado, sem atrativos, imperfeito, rejeitado, abandonado, sozinho).
3.      Crenças nucleares de desvalor (Crenças sobre ser incapaz, incompetente, inadequado, ineficiente, falho, defeituoso, enganador, fracassado, sem valor). 

Associado as crenças centrais estão os esquemas. A diferença entre eles é 
que as crenças centrais são o conteúdo e os esquemas são as estruturas. Segundo Beck (1964,1967 apud Knapp, 2004, p.23)
“Esquemas são estruturas internas de relativa durabilidade que armazenam aspectos genéricos ou prototípicos de estímulos, idéias ou experiências, e também organizam informações novas para que tenham significado, determinando como os fenômenos são percebidos e conceitualizados.”

                Os esquemas primitivos mal adaptativos também são construídos a partir de interações disfuncionais com pessoas importantes na vida inicial do indivíduo. Os esquemas são compostos de cognições, memórias e sensações corporais vivenciadas pelo individuo e por sua interação com o outro, que servem como molde para o processamento de experiências.
Tais esquemas são considerados verdades absolutas, difíceis de modificar sem o trabalho terapêutico, estando também associados a um grande nível de afeto quando ativados (raiva, ansiedade, culpa ou tristeza), o que facilita a visualização do esquema, possibilitando o confronto e a modificação do mesmo (YOUNG, 2003)
Estes esquemas são desencadeados quando existe alguma mudança negativa na vida do indivíduo. Além disso, são autoperpetuáveis, ou seja, para que se mantenham, já que são resistentes à mudança, recorrem a três formas de atuação visando o reforçamento do esquema. Segundo Young (2003) e Knapp (2004) os processos de um esquema são:
-  Manutenção do esquema: são utilizados o pensamento e o comportamento de forma a reforçarem o esquema. Age de acordo com uma profecia auto realizadora, pois o indivíduo atua de maneira a fazer que o esquema se mantenha. Além disso, algumas distorções cognitivas estão presentes, entre elas estão: maximização, minimização, abstração seletiva e generalização.
-  Evitação do esquema: como o próprio nome já diz, o indivíduo busca evitar que o esquema seja ativado. Pode ocorrer através da evitação cognitiva, no qual o indivíduo bloqueia pensamentos ou imagens referentes ao esquema. Na evitação afetiva, o indivíduo bloqueia os sentimentos, sendo muito comum relatarem não sentir nada em situações que gerariam emoções na maioria das pessoas e por fim, a evitação comportamental que está associada ao fato do individuo evitar situações que possam desencadear o esquema.
-  Compensação do esquema: Atuam tanto de forma cognitiva quanto comportamental e acabam atuando no polo oposto ao esquema. Por exemplo, se a pessoa tem um esquema de desconfiança, acaba confiando em todos. Muitas vezes é considerado de forma funcional, pois o individuo atua de maneira a atender as necessidades, porém acaba não dando certo, pois tudo precisa de um equilíbrio, que está ausente neste processo. 
Como podemos ver, a TCC é uma abordagem terapêutica diretiva e semiestruturada que visa à resolução de problemas. Tanto terapeuta quanto cliente tem um papel ativo no desenvolvimento da terapia, estabelecendo metas e tarefas entre as sessões. O cliente aprende a ser seu próprio terapeuta, através do aprendizado adquirido no decorrer das sessões e também através do feedback presente na relação terapêutica, possibilitando assim, uma melhor resposta futura frente a adversidades que surjam. Durante o processo terapêutico, o cliente aprende através de técnicas específicas a identificar seus pensamentos e crenças disfuncionais buscando alternativas mais adaptáveis para sua vida.
Referente ao tempo de tratamento existe uma variação, Nos estudos feitos por Beck (1976, Abreu, 2004, p.284), a proposta seria de quatro a quatorze sessões semanais. Neste mesmo estudo, foi apontado que alguns clientes podem levar de 1 a 2 anos para modificar suas crenças e comportamentos disfuncionais. Em outro estudo realizado por Beck e Freeman (1993, Abreu, 2004, p.284) apontam que a melhora dos sintomas está associada à motivação do cliente e da possibilidade de resolução do problema.
Apesar de parecer uma abordagem simples, existem vários detalhes que devem ser levados em consideração. No texto a seguir veremos mais informações sobre a Terapia cognitivo-comportamental. Espero que tenham gostado até aqui. :)


Referências bibliográficas
PADESKY, Christine A. Aaron Beck – A mente, o homem e o mentor. Organizadores: LEAHY, Robert L et al. Terapia cognitiva contemporânea: teoria, pesquisa e prática. Porto Alegre: Artmed, 2010. p.19

KNAPP, Paulo. Princípios fundamentais da terapia cognitiva. Organizadores: KNAPP, Paulo et al. Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica. Porto Alegre: Artmed, 2004, p.19.

YOUNG, Jeffrey E. Terapia cognitiva para transtornos da personalidade – uma abordagem focada no esquema. Porto Alegre: Artmed, 2003.

BECK, Judith S. Terapia cognitiva – teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 1997.

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